CMN mantém proibição a CRI autorizado pela CVM
em Valor Econômico, 5/março
Órgão esclarece pontos de resolução, mas advogados apontam trechos ainda “nebulosos”.
Os ajustes feitos na última sexta-feira pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) na resolução 5.118, que mudaram as regras para emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e do Agronegócio (CRA), frustraram as expectativas do mercado. Isso porque esperava-se que o órgão voltasse atrás em um dos pontos que geraram mais polêmica no texto original, de 1º de fevereiro: a proibição dos chamados CRI e CRA de reembolso. Pelo instrumento, as empresas podiam emitir dívidas para ressarcimento de despesas realizadas nos 24 meses anteriores à operação.
Essas emissões eram balizadas por decisões colegiadas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No caso dos CRIs, era um instrumento permitido desde 2019. Já os CRAs de reembolso foram autorizados em 2022. “Havia uma expectativa de que eles pudessem rever essa parte”, diz Ricardo Stuber, sócio do TozziniFreire. “Se a gente pensar no ciclo do desenvolvimento do empreendimento imobiliário, muitas vezes o empreendedor compra e começa a desenvolver o projeto e só depois acessa o mercado. Com isso, o uso de recursos para reembolso passou a ser natural no setor imobiliário.”
Evandro Buccini, sócio e diretor de gestão de crédito e multimercado da Rio Bravo Investimentos, ressalta que havia expectativa de que o CMN voltasse atrás justamente por causa desse ciclo mais longo do setor imobiliário. “É muito injusto uma empresa que desenvolveu um projeto, tal qual o regulador acha que pode ser fruto de emissão de CRI, não pode algum tempo depois fazer a operação.”
Pela resolução do CMN, CRAs e CRIs não poderão ser lastreados em direitos creditórios “decorrentes de operações financeiras cujos recursos sejam utilizados para reembolsos de despesas.” Como a expressão “operações financeiras” pode ter ampla leitura, medidas adicionais da CVM podem adotar entendimento diferente, mas, por ora, a interpretação é que não há brechas e tudo foi vetado. Procurada pelo Valor, o órgão afirmou que “está ciente da decisão em questão e tomará as medidas cabíveis, se necessário.” Diz ainda que permanentemente moderniza a regulamentação e supervisão, “em função de fatores diversos, tais como estruturas inovadoras, experiência da supervisão, demandas de agentes de mercado e interações com demais reguladores.”
Outros pontos do texto ainda precisam ser explicados, segundo advogados. Um deles diz respeito ao conceito de “atividade decorrente do agronegócio”. A regra diz que as empresas não poderão mais emitir os títulos caso não tenham, no caso do CRA, menos de dois terços de sua receita consolidada proveniente do agronegócio. “Para o imobiliário é mais fácil traçar uma linha do que é receita imobiliária e do que não é, mas no agronegócio há uma série de atividades concatenadas numa cadeia produtiva com diversos agentes. Então há zonas cinzentas que deveriam ser endereçadas seja pelo CMN ou pela CVM”, diz José Alves Ribeiro Junior, do escritório VBSO Advogados.
Também segue “nebulosa” a possibilidade de contratação de fianças bancárias no contexto das emissões de CRI ou CRA ou a contratação de seguros nestas situações, no caso de a seguradora ser parte relacionada a uma companhia aberta ou do conglomerado de uma instituição financeira. “Para nós, a prestação de uma fiança bancária não representa uma captação de recursos para o banco, mas a redação da norma não deixa isso claro ainda”, diz Junior.
A mudança principal foi permitir que empresas que tenham alguma relação com instituições financeiras, desde que não façam parte do mesmo conglomerado, possam emitir os títulos. Antes, isso não era possível, mas o conceito era muito amplo e poderia até incluir uma empresa que tivesse acionistas em comum com um banco. Um exemplo é a MRV, criada pela família Menin, também fundadora do banco Inter. Outro é a JBS, que tem relação com o Original, controlado por uma holding da família de Joesley e Wesley Batista.
Além disso, o CMN deixou claro que contratos ou obrigações de natureza comercial, como duplicatas e contratos de locação, podem ser usados como lastro para CRAs e CRIs. Antes, a norma não permitia, por exemplo, que contratos de locação devidos por companhias abertas fossem securitizados, mesmo quando o emissor fosse empresa do ramo imobiliário que alugasse o imóvel.
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